
Parecer jurídico – Teletrabalho
Por Silvia Márcia Nogueira, presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB-PE
1 – DO TRABALHO PRESTADO FORA DAS DEPENDENCIAS DO EMPREGADOR
O trabalho executado fora das dependências do empregador, especificamente aquele remoto, é chamado de teletrabalho, e recebeu do TST numa cartilha a expressão “ trabalho de onde você estiver”. Os recursos tecnológicos são as ferramentas através das quais este labor é prestado. Na verdade, ele é o gênero que envolve todo tipo de trabalho desempenhado fora das dependências do empregador. Pode ser numa lan house, num café, num coworking etc. Basta o acesso à internet. Por sua vez, o trabalho desempenhado na residência do empregado é chamado de home office. Importante observar que o serviço feito em casa pode acarretar muitos males físicos e psíquicos, os quais dificilmente conseguem se caracterizar como doença ocupacional. A pandemia trouxe de forma mais efetiva esta modalidade de labor.
Segundo o IBGE nos primeiros meses da pandemia do Coronavirus em torno de 8,5 milhões de trabalhadores exerceram suas funções remotamente.
Com o avanço desta modalidade de trabalho, começou-se a constatar doenças como lesões na coluna ou lesão por esforço repetitivo (LER) as quais decorrem da falta de condições ergonômicas adequadas para a realização do trabalho em casa. Já a falta de um espaço adequado, somado a jornadas exaustivas, pode causar aumento do estresse, resultando em adoecimento psíquico.
A regulamentação do teletrabalho está prevista nos arts. 75- A a 75-E, da CLT, nos quais são estabelecidas, basicamente, a necessidade de previsão expressa no contrato de trabalho, que deve discriminar as atividades que serão desempenhadas pelo empregado, e dispor sobre responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas, e garantindo o prazo de 15 dias de antecedência para transição de regime presencial/remoto..
Assim, a reforma trabalhista implementada pela lei 13.467/17 previu o teletrabalho no art. 75 da CLT e acrescentou no art. 611-A que podem ser negociados e criados por meio de normas coletivas ( Acordo ou Convenção) regulamentação sobre o teletrabalho. Assim, as cláusulas que vierem a ser estabelecidas podem/devem garantir de forma mais ampla direitos específicos aos trabalhadores que prestarem o serviço em teletrabalho, vez que, o texto legal não traz proteção suficiente para esta modalidade de prestação de serviço.
2 – DA OBRIGAÇÃO PATRONAL COM O CUSTEIO DA IMPLANTAÇÃO DO HOME OFFICE
Importa ainda ressaltar que no art. 75-D da CLT o legislador reformista aponta para o “reembolso” das despesas arcadas pelo empregado, o que revela de forma clara que incumbe ao empregador arcar com o custo para a implementação do home office. Transcrevemos abaixo referido dispositivo legal:
Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência)
Isto não poderia ser diferente, vez que é o empregador aquele que contrata o serviço, admite, assalaria o trabalhador e dirige a prestação do serviço. O ônus com a alteração do contrato de trabalho não poderia ser transferido à parte débil da relação de trabalho.
Além disso, cabe ao empregador a missão de cuidar da saúde daqueles que lhes prestam serviço, e neste diapasão, também as medidas de ergonomia devem ser pensadas para impedir o adoecimento do empregado. O fato da prestação do serviço está sendo realizado fora das instalações da empresa não autorizam a irresponsabilidade patronal para que o serviço seja prestado em ambiente que preserve a saúde do trabalhador.
3 – DA NECESSIDADE DE ADITIVO AO CONTRATO DE TRABALHO
Em 2020 a MP 927 considerando o estado de calamidade publica da pandemia permitiu a alteração do regime presencial parta o teletrabalho independentemente de acordo individual ou coletivo, e dispensou o registro prévio desta alteração na CTPS. Esta MP perdeu a vigência em 19 de julho de 2020.
Doravante há a necessidade de se fazer um ajuste no pacto laboral para se implementar esta alteração. Importa lembrar que o art. 468 da CLT autoriza mudança na pactuação, desde que haja mutuo consentimento e que a alteração implementada não traga prejuízos direta e nem indiretamente ao empregado.
Se o empregador tiver a necessidade de implantar o trabalho remoto, deve celebrar um Termo Aditivo ao contrato de trabalho de seus empregados, e apara isto, entendo como necessária a abertura de um diálogo com o sindicato profissional para a formulação de Um Acordo Coletivo de trabalho a disciplinar esta modalidade remota de prestação de serviço.
4 – DO CONTROLE DE JORNADA
A MP 1.108/22 alterou o art. 76-C esclarece que a implantação deste regime impõe que seja constato no contrato de trabalho, e ainda, que se a iniciativa pelo trabalho remoto for do empregado, ele será o responsável pelo pagamento das despesas com esta implementação. A vigência desta MP 1108/22 encerra em 25 de julho de 2022.
De certa forma a legislação brasileira sobre teletrabalho não previa controle de jornada, sendo que a MP 1108 isenta de controle de jornada apenas empregados que trabalham por produção ou tarefa. Neste sentido, passa a ser obrigatório o controle de jornada dos empregados em teletrabalho ou home office que não prestem serviço por tarefa ou por produção.
5 – PRECEDENTE SOBRE A MATÉRIA
A jurisprudência sobre o assunto ainda é escassa, mas o TRT da 24ª Região, ao julgar o Recurso Ordinário nº 0024280-79.2016.5.24.0002, entendeu que:
“O labor prestado em domicílio, a exemplo do teletrabalho, não exime o empregador da fiscalização das condições laborais, especialmente quanto à ergonomia (art. 75-E da Lei Consolidada – CLT), pois a redução dos riscos inerentes ao trabalho constitui garantia constitucional do empregado e dever do empregador (inciso XXII do art. 7º da Carta Suprema e nas normas constantes da Convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho, incorporada ao ordenamento jurídico nacional e, portanto, integrante do bloco de constitucionalidade, pois diz respeito ao direito fundamental à saúde e à segurança do trabalhador, integrando o dever geral de proteção do empregador, pois ao criar, organizar e dirigir a empresa, o empresário ou empregador gera não apenas riscos econômicos do negócio, mas também para a segurança das pessoas que laboram em benefício da organização.”
6 – CONCLUSÕES
Diante de tudo que fora exposto, concluímos que diante da necessidade do empregador em implantar esta modalidade de prestação de serviço, impõe-lhe a celebração de um aditivo contratual, assumindo a tarefa de arcar com as despesas com internet, energia, equipamentos, cadeiras adequadas, enfim, tudo a proteger a ergonomia para impedir o adoecimento do trabalhador. Ademais, também deve ser implementado mecanismo de controle de jornada para que o trabalho seja desempenhado dentro da limitação prevista na legislação